Anna Magnani é sinônimo de talento! A grande estrela ganhou um Oscar de Melhor Atriz por sua interpretação em A Rosa Tatuada (The Rose Tattoo, 1955) - a primeira italiana a ganhá-lo - e foi indicada novamente, dois anos depois, por A Fúria da Carne (Wild is The Wind, 1958). Como se não bastasse, ela também foi a protagonista de grandes clássicos como Belíssima (Belissima, 1952), Roma Cidade Aberta (Roma, cittá aperta, 1945) e Mamma Roma (idem, 1962).
A atriz, apesar de sua vida atribulada, também foi uma mãe fiel para seu filho Luca Magnani, fruto de seu relacionamento com Massimo Serato -original Segato. Luca, infelizmente, contraiu pólio aos 3 anos de idade e Anna fez de tudo para que ele fosse bem cuidado e tivesse uma vida dentro da normalidade.
Tanto que, sobre sua mãe, em entrevista ao jornal La Stampa, Luca descreveu:
Nem eu e nem a minha mãe sentimos falta de uma figura paterna em nossas vidas. Mesmo que fosse difícil, ela criou a si mesma: ela não tinha um diretor ou produtor para protegê-la, ela não tinha saída. Ela não tinha como preparar minha comida ou me colocar na cama todas as noites.
Luca e sua mãe: Anna Magnani |
A história dessa mãe e filho começa quando Anna conhece Massimo Serato, naquela época ainda com o nome Massimo Segato, em meados de 1940. Foi naquele período que Anna começaria a atuar no teatro Quatro Fontane di Roma - ela já era uma atriz respeitada, mas não famosa - e mal imaginava que se apaixonaria pelo jovem ator, que atuou com ela posteriormente em produções de Carmen e Cantachiaro nesse teatro.
Anna e o jovem galã se conheceram, de acordo com a biografia Anna Magnani: La biografia de Matilde Hochkofler, em uma das festas de Ottorino Visconti, primo de Luchino Visconti. Então, Anna ainda era casada com Goffredo Alessandrini, que tinha acabado de ter uma filha, fora do casamento, com Regina Bianchi. Assim, Anna se via livre para ter um caso com quem quisesse e ficou encantada por Massimo: nove anos mais novo e lindo de morrer (ou de viver, depende de sua perspectiva).
Segundo o livro Anna Magnani Vita, amori e carriera di un'attrice che guarda dritto negli occhi de Italo Moscati, o encontro de Anna e Massimo na festa aconteceu bem no jeito Anna de ser:
Ela estava irritada com a festa e resolveu telefonar para sair com Goffredo ou achar algum amigo para passear por Roma à noite. Mas o telefone estava ocupado por uma pessoa muito falante e que não se importava que Anna precisava usar o telefone. A espera foi se tornando insuportável e Anna se aproximou e deu uma enorme batida ao lado do homem. Foi ai que ela conheceu o jovem Massimo Serato.
Massimo Serato (então Giuseppe Segato) em 1940, ano de seu encontro com Anna |
Apesar das objeções da mãe de Massimo, que considerava o filho muito novo para namorar a estrela, os dois começaram um caso quente - repleto de idas e vindas. Apaixonada, Anna até conseguiu que quando o jovem foi chamado para participar da Segunda Guerra Mundial, em 1942, que ele fosse para Turin, ou seja, não participando dos contingentes centrais da guerra. Ademais, Massimo teria licenças para continuar a trabalhar no filme Giacomo l'idealista (idem, 1943), com Anna salvando seu amado dos maiores terrores da batalha.
Os dois até tentaram, em uma época, morarem juntos, mas Massimo se sentia sufocado pelas brigas com a atriz e foi morar com sua mãe em um local mais afastado da cidade. Conta-se que Anna sentia que Massimo era como um "gato", desaparecendo ocasionalmente de sua vida e depois pedindo para ser enchido de carícias e abraços. Inegavelmente, Massimo, por sua parte, se sentia atraído pela sensualidade certeira de Magnani. Segundo o livro La Magnani de Patrizia Carrano e Federico Fellini, os dois viviam entre "anos de brigas, discussões, mas também felicidade".
Em fevereiro de 1942, Anna Magnani finalmente realizou o seu maior desejo, o de saber que iria se tornar mãe, dando à luz em 25 de outubro de 1942 (alguns afirmam 23 e outros 29) um menino chamado Luca. Com a notícia da gravidez, ela declinou o papel principal no clássico Obsessão (Ossessione, 1943) que foi estrelado por Clara Calamai. Vale lembrar que a atriz italiana nunca havia conhecido seu pai e sua mãe a abandonou - ela foi criada em Roma pelos avós. A biografia de Italo Moscati afirma que, apesar de Massimo ter ficado maravilhado em se tornar pai, ele não se sentia preparado.
Sobre o nascimento do filho, em 1942, Anna reconta via Anna Magnani Por Matilde Hochkofler:
Quando nasceu o meu filho foi um grande dia. No hospital eu estava com medo, medo por tudo que sofreria por um filho que ainda não tinha conhecido. Eu suava, suava. Agarrando-me desesperadamente a cama de operação eu sentia o suor escorrer e gritava como um gavião. Minha garganta queimava. Como você me fez sofrer meu filho, mas depois tudo voltou ao normal. Eu estava bem.
Anna com seu lindo filho Luca em 1943 |
Apesar da felicidade, Anna nem podia dar seu sobrenome ao filho, já que ainda estava legalmente casada com Goffredo Alessandrini. Massimo apenas poderia dar o sobrenome ao filho se registrasse no cartório o nascimento como: "Filho de Massimo Serato e desconhecida", pelo fato de Anna ainda ser legalmente casada. Em contrapartida, ela não havia dado permissão que seu marido desse seu sobrenome às duas filhas que teve fora do casamento com Regina Bianchi, mas, por sorte, Anna conseguiu que Alessandrini desse seu sobrenome ao bambino. Luca, apenas na fase adulta, passou a usar o sobrenome Magnani.
Anna e Massimo continuaram juntos após o nascimento de Luca, mas as brigas explosivas do casal continuavam aumentando e se tornando épicas. Sobre as discussões do casal, Jole Tuzzi, que trabalhou com Mario Soldati no filme estrelado por Massimo, Quartieri alti (idem, 1943), afirmou ao livro de Italo:
Ele [Massimo] aparecia apaixonado, mas estava muito perdido. Eles não conseguiam parar de brigar. Ela chegava ao set de filmagens calma e depois de dois minutos tinham brigas e escândalos. Anna não se limitava: se queria fazer, fazia. Quando ela não vinha, os dois se telefonavam. Todo mundo sabia que eles estavam muito apaixonados.
Apesar do que se fala a respeito do relacionamento entre Anna e Massimo, os dois não se separaram logo após o nascimento do filho Luca. De acordo com ambas as biografias de Anna, ela e Serato continuaram a sair e colaboraram no teatro nas seguintes peças: Cantachiaro (1944), Carmen (1944), Soffia So (janeiro de 1945) e pela última vez em Cantachiaro nº 2 em maio de 1945.
Anna Magnani em cena de Roma, Cidade Aberta (Roma, città aperta, 1945) |
Os dois, portanto, ainda estava juntos em janeiro de 1945, quando Anna começava a gravar um de seus maiores clássicos e seu primeiro grande sucesso no cinema: Roma, Cidade Aberta (Roma, città aperta, 1945). Tanto que de acordo com Sergio Amidei, roteirista do longa-metragem, a famosa cena da personagem de Anna, no qual ela corre atrás dos alemães e é morta, foi inspirada em uma briga com Massimo:
Nós tínhamos encontrada uma pessoa que permitiu que gravássemos à noite em Trastevere, atrás das barragens da polícia. Anna estava brigando com Massimo Serato, eu não queria me envolver, então fiquei de fora e vi Serato sair correndo da casa, entrar em um carro e pedir para a Toddini levá-lo para cidade. O carro começou a partir e de lá aparece Magnani, correndo com suas pernas tortas, brava e gritando: 'Seu filho da puta! Bastardo! Canalha!' Foi assim que a cena clímax do filme nasceu. - trecho de La Cittá del Cinema via Passion and Defiance: Italian Film from 1942 to the Present por Mira Liehm
Se essa cena entre Massimo e Anna realmente aconteceu, não temos como afirmar. Porém o que se sabe é que o relacionamento deles já estava se deteriorando quando ambos descobriram que seu filho Luca, aos dois anos de idade, havia contraído poliomelite (uma doença viral que pode levar a criança à paralisia completa). A vacina apenas foi liberada em 1955 e durante o período da Segunda Guerra Mundial, houve uma severa epidemia na Itália que foi apenas erradicada no começo dos anos 50.
Foi com a doença de Luca - descoberta durante as gravações de Roma, Cidade Aberta (Roma, città perta, 1945) - que Serato resolveu largar de vez a família, especialmente quando os cuidados com Luca se provaram bem mais do que ele estava disposto a dar.
Foi com a doença de Luca - descoberta durante as gravações de Roma, Cidade Aberta (Roma, città perta, 1945) - que Serato resolveu largar de vez a família, especialmente quando os cuidados com Luca se provaram bem mais do que ele estava disposto a dar.
A indiferença dele diante à família, de acordo com Italo Moscati, apenas aumentava e o descontentamento entre eles fez com que Massimo deixasse seu filho e Anna para trás. De forma covarde, Massimo nunca mais fez parte da vida de Luca. Foi aliás, no final das gravações de Roma, Cidade Aberta (Roma, città aperta, 1945) - que durou de janeiro a maio de 1945 - que Anna se encantou por Roberto Rossellini - diretor do longa-metragem- com quem ela ficou até 1949, quando o diretor então conheceu e se apaixonou por Ingrid Bergman.
Anna Magnani e seu filho posam para a revista Life em 1950 |
Nesse ínterim, a carreira de Anna nos cinemas finalmente florescia - e o fluxo de dinheiro aumentava - e ela fazia questão de pedir uma grande quantia de dinheiro em seu cachê, para que ela pudesse dar os melhores cuidados para seu filho Luca. Infelizmente, Luca nunca conseguiu reaver o movimento das pernas e passou o resto da vida andando de muletas. Hoje ele tem 77 anos de idade.
De acordo com a entrevista de Luca ao site La Stampa, ele foi enviado para viver na Suíça em um internato, recebendo os melhores cuidados para sua saúde. Ele apenas retornava para a Itália nos feriados e nas férias de verão. Aos 16 anos de idade, ele voltou ao país para morar com a mãe, contudo em um arranjo diferenciado: ele vivia em um apartamento ao lado dela, no mesmo andar.
Sobre isso, ele explica:
Foi o jeito certo. Nós tínhamos duas vidas diferentes. Eu ia para escola, acordava cedo. Ela trabalhava até as duas da manhã e acordava bem tarde. Nós nos víamos à noite quando voltava da escola. Nós jantávamos juntos.
Luca Magnani também conta que tinha um problema em manter as notas escolares altas e tinha uma tática para diminuir o impacto da ira de sua mãe: mostrar seu boletim de manhã, assim quando ele retornava à noite ela não estava tão nervosa. Mesmo assim, ele afirma: "quando ela ficava brava, ela ficava brava."
Quando Anna ganhou o Oscar de Melhor Atriz pela A Rosa Tatuada (The Rose Tattoo, 1955), de acordo com o livro Anna Magnani, quattro storie americane de Cristina Vaccarella, Luigi Vaccarella, ela deixou claro que o mais importante para ela era o seu bambino e que aquele prêmio era para ele: "Tudo que fiz foi pelo meu filho Luca".
Quando Anna ganhou o Oscar de Melhor Atriz pela A Rosa Tatuada (The Rose Tattoo, 1955), de acordo com o livro Anna Magnani, quattro storie americane de Cristina Vaccarella, Luigi Vaccarella, ela deixou claro que o mais importante para ela era o seu bambino e que aquele prêmio era para ele: "Tudo que fiz foi pelo meu filho Luca".
Anna e seu filho galã em um evento de 1961 |
Apesar de ser um arranjo incomum, a medida de moradia funcionava para Luca e Anna. Os dois sempre se divertiam e saíam juntos, como um par de mãe e filho bem unidos. Ele não seguiu a mesma carreira que sua mamma - apesar de ter a beleza de galã do pai - e se formou na faculdade em Arquitetura. Em 1974, aos 32 anos de idade, casou-se com a atriz Gigliola Faenza, com quem teve sua única filha Olivia Magnani, nascida em 1974- esta seguiu os passos da avó e tornou-se uma atriz.
Luca e Gigliola se divorciaram em 1986, e a atriz até fez uma festa super exclusiva para comemorar o divórcio! Anna Magnani faleceu em 16 de setembro de 1973 e não pode conhecer sua neta. Já Massimo Serato, faleceu apenas em 1989, e apesar de alguns casos com atrizes famosas, e alguns casamentos curtos, não teve mais nenhum filho e pelo que pesquisei, nunca quis ter contato com o Luca.
Em entrevista ao jornalista Louis Valentin, publicada em outubro de 1973, um mês depois de sua morte, Anna fez como se fosse uma biografia de sua vida e dedicou lindas palavras ao seu filho:
Luca Magnani, foto recente, em sua casa - atrás uma foto de Anna Magnani Da Gospia |
Hoje Luca é um homem. Talvez ele tenha os mesmos sentimentos que tinha sobre a minha mãe. Mas eu não queria deixá-lo Luca, eu não queria abandoná-lo. Um dia você entenderá que nossa separação era necessária. Hoje tenho medo de seu silêncio, de sua solicitude e de seu caráter difícil. Me diga que é apenas uma fase temporária, assim como eu tinha quando queria 'conquistar' a minha mãe. Vai passar. Eu só peço para viver o máximo de tempo que posso ao lado de meu filho. - replicado no site Archivio Anna Magnani.
Anna, no entanto, não precisava se preocupar. Seu filho Luca, já afirmou com todas as palavras: "ela era o homem da casa, no final das contas era ela que tinha que pagar as contas em dia", mostrando o quanto a admirava por sua força e obstinação.
Apesar de terem vidas diferentes, o carinho e amor entre Luca e Anna Magnani são lindos de se ver e de recontar para o público. Uma verdadeira história de amor!
Apesar de terem vidas diferentes, o carinho e amor entre Luca e Anna Magnani são lindos de se ver e de recontar para o público. Uma verdadeira história de amor!
Só um detalhe, a vacina contra pólio surgiu depois da data da pólio de Luca.
ResponderExcluirOlá, Magui, boa tarde!
ExcluirRealmente no texto não ficou claro, vou adicionar a informação, muito obrigada :)
Volte sempre!
Que linda essa historia dessa atriz apesar dos contras ela foi em frente gostaria de que virasse um filme .
ResponderExcluirConcordo! Acho que essa história seria um filme lindo!
ExcluirVolte sempre :)