A visita calma de Joselito ao Brasil

Joselito Jimenez, ou apenas Joselito, foi o grande menino prodígio da Espanha. O ator, que completou 80 anos de idade em 11 de fevereiro deste ano, pode até ser um nome esquecido do grande público, mas conta com fãs fieis - e que continuam a se encantar por sua voz. 

Nascido José Jiménez Fernández em 11 de fevereiro de 1943, o ator e cantor veio de uma família humilde - com mais sete irmãos e os pais trabalhando nos campos de Beas de Segura, Jaén, Andaluzia-mas a música sempre esteve presente na vida dele. Quando tinha apenas três anos, Joselito já se apresentava com o tio Antón em tavernas ao redor da cidade e com ciganos. Devido à pobreza, o irmão mais velho dele, Antonio, decidiu sair de sua cidade natal para trabalhar em Valencia, e Joselito foi junto. Foi lá, cantando e trabalhando, que ele chamou atenção do eletricista Eloy Ballesteros, que viu seu potencial e decidiu ajudá-lo -tornando-se seu tutor e empresário. 

Joselito em sua visita ao Rio de Janeiro em 1959                        O Cruzeiro

Joselito foi gerenciado por Eloy e, em entrevistas posteriores, o acusou de roubar praticamente todo o seu dinheiro. Aos 10 anos de idade, no entanto, ele já era um grande sucesso nos programas de rádio, chamando atenção do grande Luis Mariano durante uma performance ao vivo na festa típica de Valência, o Fallas. Dali foi para Paris participar da TV ao lado de Maurice Chevalier e Silvana Pampani. No programa de rádio Cabalgata Fin de Semana, de Bobby Déglane, de volta à Espanha, ele virou 'alvo' de Antonio del Amo e do produtor Césareo González, que o ofereceram um contrato com a Suevia Films. 

Aos 13 anos de idade, portanto, Joselito estrelou nos cinemas com o filme O Pequeno Rouxinol (1956) - alcunha pela qual ficou conhecido - e foi um grande sucesso. Para prolongar seu tempo nos holofotes como estrela mirim, os produtores aproveitaram que ele era um adolescente pequeno e falsificaram seu ano de nascimento - de 1943, ele agora havia nascido em 1947. 

Aproveitando o frisson, Joselito protagonizou, em sequência, os filmes Saeta (1957), Rouxinol das Montanhas (1958) e Escuta Minha Canção (1959). E foi em junho de 1959 que o ator e dono de uma das vozes mais lindas da Espanha, o Menino da Voz de Ouro, veio ao Brasil durante uma turnê promocional pela gravadora RCA Victor. 

Joselito em São Paulo em 5 de junho de 1959

Em turnê pelas Américas, Joselito desembarcou com seu empresário e tutor, Eloy, com o guitarrista Ernesto Fellosa, conhecido como El Chuja, e o diretor da Suevia Films, Jose Pumareja, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em 5 de junho de 1959. O desembarque foi breve, afinal ele seguia para o Rio de Janeiro, mas foi suficiente para conversa com os jornalistas.

Com desenvoltura, o menino de 12 anos (que na verdade tinha 16), afirmou que era fã de Pablito Calvo, outro artista mirim, quem considerava melhor ator que ele e deixou claro que era fã do jogador Vavá, muito mais do que Stefano. Instigado a cantar 'Bolerias', ele declinou: "Penso que o público de São Paulo ficará mais contente de me ouvir cantar no palco, onde terei acompanhantes, assim gostarão muito mais de nossa canção". 

Em 6 de junho de 1959, ele chegou ao Rio de Janeiro pelo Aeroporto de Galeão, com sua vara de pescar, e foi recebido com entusiasmo pelos fãs. O pequeno assinou autógrafos, conversou com a imprensa, deu beijo em fãs. Com bastante desenvoltura, ele só ficou sem graça ao ser indagado sobre namoradas e logo afirmou: "Tenho apenas algumas amiguinhas". 

Joselito recebendo o carinho dos fãs no Rio

Aproveitando o final de semana, Joselito fez seu primeiro passeio na Sociedade Hípica Brasileira, onde andou à cavalo duas vezes e concedeu, novamente, autógrafos. Foi aos pontos turísticos como Pão de Açúcar, Baia de Guanabara e até para o Corcovado. Acompanhado de jornalistas do Cruzeiro, ele levou sua vara de pescar e fez um lindo ensaio na lagoa Rodrigo de Freitas. No domingo, ele teve um jantar em sua homenagem por Luis Barroso e Jorge Gomes na SHB do Rio de Janeiro. 

Naquele mesmo final de semana, ele almoçou na sede da revista Radiolândia, no Rio de Janeiro, acompanhado de seu tutor e de outros jornalistas. Segundo a reportagem, Joselito ficou encantado com as revistas e também afirmou "devorar" livros infantis.  

Joselito na Rio Gráfica para um almoço

Em 8 de junho daquele ano, ele seguiu no Rio para a exibição do filme Saeta - A Canção do Rouxinol, promovida pela gravadora RCA-Victor, em sessão especial na ABI (Associação Brasileira de Imprensa), às 18h, e logo em seguida, houve um cocktail com a presença do pequeno ator. 

Às 21h, naquele mesmo dia, ele se apresentou na TV Rio cantando seus maiores sucessos, sempre encantando à todos com sua simpatia. Em 9 de junho, das 21h às 22h, ele também se apresentou cantando - e era unânime como tinha uma voz bela. Joselito encontrou diversos famosos, inclusive o cantor Vicente Celestino, sendo citado na biografia da esposa dele, a também cineasta Gilda de Abreu. 

De acordo com o Diário Carioca, ele concedeu dezenas de autógrafos, inclusive de um padre que lhe deu um terço de presente. Em 10 de junho, ele retornou para São Paulo para apresentar canções como 'Donde Estas Mi Vida', 'Campanera' e 'Sueño Desperto' no canal 3, às 21h30. 

Joselito pescando no Rio de Janeiro 

Em São Paulo, Joselito também participou da première de Saeta no Cinema Rivoli, onde foi entrevistado por José Carlos de Morais - sendo novamente exaltado por suas respostas concisas e atenciosas. Em 12 de junho, o ator mirim compareceu à um cocktail na Casa de Cervantes e conversou com a imprensa, afirmando que as caçadas e passeios à cavalo eram suas coisas favoritas na cidade. 

Em 15 de junho, o astro se apresentou na TV Tupi, às 20h, cantando músicas espanholas e conversando com o apresentador José Carlos de Morais. Em 19 de junho, Joselito foi embora para o México para gravar um novo filme, o As Aventuras de Joselito (1960). Apesar das tentativas da RCA Victor de dar destaque para Joselito, não ocorreu um furor como no caso de outros astros e ele pode aproveitar sua estadia no Brasil de forma mais tranquila - e sem grande cobertura da mídia. 

Joselito em São Paulo

Joselito partiu pela Brainff Airways para o México e fez a festa de diversos fãs que se despediam dele no seu embarque. A carreira de José continuou com filmes, apostando em sua feição infantil, atuando pela última vez na obra Prisioneiro en La Ciudad (1969) - quando já tinha 26 anos de idade. Antes de encerrar a carreira, Joselito performou para Che Guevara, Fidel Castro e fez apresentações de sucesso no Ed Sullivan Show, nos Estados Unidos. 

Como quase todo artista mirim, Joselito foi passado para trás pelo seu agente, Eloy, que além de ganhar 60% de cada contrato, ainda deduzia despesas com viagens e hospedagens, da parte do próprio ator e cantor - ele chegava a ganhar US$5 mil por cada show fora da Espanha e ele fazia cinco por dia. Nenhuma das casas ou carros comprados estavam em seu nome. 

Em 1969, com o fracasso do filme Prisioneiro en la Ciudad, ele decidiu sair de vez dos holofotes e se casou com a atriz Chonette Laurent, com quem atuou na película. Os dois tiveram os filhos Isaac e Eva e, doze anos depois de seu divórcio, em 1978, ele se casou com sua namoradinha de infância, a agora professora MariFé Gabaldón em 1986. 

Joselito ao lado de Vicente Celestino e partindo de São Paulo em 1959

Joselito chegou a morar em Angola entre nos anos 1970, durante seu primeiro casamento, com a ajuda de uma distribuidora de filmes de Portugal - a Angola Films para produzir uma série de performances e premières de seus filmes. As autoridades do país, no entanto, o acusaram de ser um mercenário para o governo português e o teriam prendido por tráfico de armas, algo que o próprio cantor negou em diversas entrevistas. Em sua defesa, ele afirma que estava transportando um guerrilha no carro, quando ficou 15 dias na cadeia. "Eu nunca fui um mercenário. Com minha estatura?", afirmou ele, mantendo ter ficado no país apenas para caçar, um de seus hobbies favoritos, e organizando safáris. 

Quando retornou para Utiél, nos anos 80, ele abriu o hotel 'El Bodégon', repleto de suvenires africanos - e diz ter se tornado viciado em drogas durante esse período de sua vida. Em agosto de 1991, ele foi detido acusado de tráfico de drogas por portar 78 gramas de cocaína e foi sentenciado a cinco anos de prisão. Ele cumpriu apenas um ano e meio, podendo sair em liberdade condicional, mas em outubro de 1993, ele foi pego novamente com 500 gramas de cocaína em uma 'emboscada' por um policial, ficando preso até 1996. 

"A prisão foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Ali curei o meu vício em cocaína e aprendi a me conformar", revelou ele para o site El Periódico em 2003. Logo depois, ele lançou sua autobiografia La jaula del ruiseñor, contando todos os detalhes de sua vida. 

Joselito se divertindo em sua estadia no Rio de Janeiro

Nos anos 2000, Joselito investiu na carreira de cantor, lançando algumas baladas românticas, e em 2008 participou do reality Supervivientes, do Telecinco, permanecendo no programa por duas semanas. O jovem, que vendeu mais discos do que o próprio Elvis Presley na Espanha, ganhou uma HQ só sobre sua vida intitulada Las aventuras de Joselito: El pequeño ruiseñor. 

Joselito estrelou filmes como Todo Mundo Hispânico (2009) - uma brincadeira com Todo Mundo em Pânico - além de Torrente 4 (2011) e El Mundo es Nostro (2012). Hoje, aos 80 anos de idade, ele vive com a esposa em Utiel, Valencia -ele tem uma estátua em Priego de Córdoba, Espanha, e uma rua com seu nome na cidade onde mora- com "sua pensão de aposentadoria e com ajuda da AISGE e General Society of Authors". Além disso, é dono de uma fazenda que produz vinho e madeira e conta com os royalties de suas canções. 

"Eu vivo bem, eu viajo com a minha esposa pelo mundo, eu jogo futebol com os meus amigos, eu estou com uma ótima saúde, vivo uma boa vida", afirmou ele em entrevista ao Larazon em 2010, quando já havia se tornado avô. Um filme sobre sua vida já está em desenvolvimento - e que vida!